Qual é a taxa de juros do mercado a se concordar nos financiamentos entre as empresas membros de um mesmo Grupo Econômico Multinacional? Quais fatores devem se considerar no escopo normativo dos Preços de Transferência?
Este artigo visa responder a essas questões que, geralmente, as empresas que pertencem a um mesmo Grupo Econômico Multinacional enfrentam diante das necessidades de liquidez para o capital de trabalho ou outros objetivos que o Grupo estabeleça nas suas políticas.
O Princípio do Comprimento do Braço (Arm’s Length Principle), ao qual está sujeita a regulamentação dos Preços de Transferência, estabelece que todas as transações devem se realizar a valores do mercado, ou determinar os preços que as empresas independentes adotam nas suas relações comerciais.
De acordo com esse princípio, estabelecer a taxa de juros do mercado para financiamentos entre empresas relacionadas pode ser bastante complexo do que a simples avaliação do risco do devedor, a moeda, o montante do principal e o prazo acordado.
Devido à faculdade dos Grupos Econômicos Multinacionais de decidir sobre as condições dos empréstimos a acordar-se, elas devem considerar as consequências fiscais, algumas das quais estão incluídas na normativa internacional dos Preços de Transferência.
Atualmente, as administrações tributárias concentram-se especialmente em fiscalizações relacionadas a financiamentos interempresariais. Consequentemente, as autoridades ajustam os juros acordados e até mesmo tendem a reclassificar as transações registradas como contribuições do capital em contas de empréstimos, dependendo do contexto da transação e analisando tanto os emprestadores quanto os devedores. Devido às fiscalizações, ajusta-se a base tributável, requerendo dos participantes o devido reconhecimento dos impostos pelas transações que determinaram o prejuízo fiscal, se aplicável. Dependendo da natureza das transações, isso não só pode afetar a liquidez das empresas, mas também pode se transformar em litígios longos e onerosos para o Grupo Econômico Multinacional.
Com relação ao financiamento na normativa dos Preços de Transferência, responde-se às seguintes perguntas: em condições normais do mercado, qual é o montante máximo que um terceiro emprestaria no caso de o mutuário não poder pagar ou não poder se unir, ou estar num país cujas políticas são instáveis, ou se a indústria em que opera for altamente regulamentada? Qual é a quantidade numa taxa a se acordar, considerando esses riscos? A taxa acordada entre partes relacionadas pode assumir como garantidores implícitos as empresas-mãe ou empresas com maior estabilidade financeira, entre outras?
Responder a essas perguntas implica realizar uma análise funcional precisa para identificar as funções desempenhadas, os ativos utilizados e os riscos assumidos pelas partes relacionadas na transação controlada.[1]
Assim, segundo as Diretrizes de Preços de Transferência da OCDE para Empresas Multinacionais e Administrações Tributárias de 2022 (Seção B.3.2. — Análise funcional), no caso de uma Empresa A, emprestadora de desembolsos, não controla o fundo outorgado, mas uma empresa-mãe P, que tem capacidade financeira para assumi-lo. Portanto, a empresa A teria direito apenas a um rendimento sem risco.
Por outro lado, ser membro de um grupo econômico também poderia considerar uma transferência de um possível risco implícito do grupo, devido ao nível de subordinação da empresa, o que implica avaliar a classificação creditícia da empresa e do grupo a que pertence.
Esse tipo de avaliações requer que a documentação e os relatórios técnicos que sustentam as transações de empréstimo entre as empresas relacionadas tenham sido acordados, cumprindo, assim, o Princípio do Comprimento do Braço. Esses estudos e documentos terão de se preparar periodicamente para cada transação de empréstimo realizada entre várias empresas do grupo.
Concluindo os aspetos abordados neste artigo, as empresas devem incluir as seguintes ações nas suas políticas ou procedimentos:
- Monitoramento trimestral das contas dos empréstimos concedidos/recebidos com partes relacionadas.
- Contrato detalhado sobre as condições dos financiamentos concedidos, especificando a taxa de mercado, o prazo, a moeda, as garantias (se for o caso), entre outros.
- Os termos e condições contratuais devem fornecer informação detalhada e consistente com a conduta real das partes envolvidas ou outros fatos e circunstâncias.
- Assessoramento externo especializado sobre as taxas de juros do mercado a se considerar, o que dependerá do tipo de financiamento.
- Monitoramento das projeções tributárias antes do fechamento do exercício contábil para proporcionar o cálculo dos juros estimados para o reconhecimento tributário direto na declaração do imposto da renda, caso for necessário.
- Análise funcional para identificar as funções, os ativos e os riscos associados à transação controlada.
- Estabelecimento de políticas de financiamento intragrupo e identificação das empresas que exercem a função centralizadora desses financiamentos.
Fonte: Diretrizes de Preços de Transferência da OCDE para Empresas Multinacionais e Administrações Tributárias. Janeiro 2022